Pela primeira vez nos últimos 17 anos, o Brasil irá gerar a incerteza sobre a garantia de alimentação a cerca de 116 milhões de brasileiros. Ou seja, mais da metade da população do país não terá certeza se conseguirá adquirir comida o bastante para colocar à mesa no dia seguinte.
Muito além de comprometer apenas a qualidade e quantidade da alimentação, a precariedade no cenário econômico provocou a fome em muitas famílias brasileiras.
Mais precisamente, 116,8 milhões de pessoas, segundo uma pesquisa publicada pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Pensan), na última segunda-feira, 5.
A situação se agravou com o início da pandemia da Covid-19, quando 19 milhões de brasileiros passaram fome no ano de 2020, ou seja, 9% da população do país. Segundo o histórico do Brasil, o último registro de um índice tão alto foi há 17 anos, em 2004, diante do percentual de 9,5%.
Em 2018 este número quase dobrou, conforme identificado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) que apontou 10,3 milhões de brasileiros nessa condição.
Na oportunidade, o analista de Políticas e Programas, Francisco Menezes, disse que, “a pesquisa revela um processo de intensa aceleração da fome, com um crescimento que passa a ser de 27,6% ao ano entre 2018 e 2020. Entre 2013 e 2018, o aumento era de 8% ao ano”, afirma.
Até o final de 2020 haviam pelo menos 19 milhões de pessoas em situação de insegurança alimentar grave. Mas, o especialista acredita que nos primeiros três meses de 2021 a situação está ainda pior.
“É urgente conter essa escalada. Não se pode naturalizar essa questão como uma fatalidade sobre a qual não se pode intervir”, continuou Menezes.
Em complemento, uma das pesquisadoras envolvidas no levantamento feito pela Rede Pensan, Rosana Salles, ressaltou que não foi apenas o aumento da fome que chamou a atenção. Mas também, e principalmente, a queda expressiva na segurança alimentar.
O índice que promovia a segurança na alimentação, que antes era de 63,3% no ano de 2018, foi reduzido para 44,8% atualmente. O último percentual tão baixo neste setor havia sido registrado no ano de 2004.
A insegurança alimentar cresceu de 20,7% em 2018 para 34,7% em 2020. Os números apontam que nem mesmo a classe média ficou isenta dos efeitos da pandemia da Covid-19.
“O acesso insuficiente em quantidade e qualidade da alimentação para família cresceu muito, principalmente a insegurança leve (não há garantia de que a família será capaz de comprar comida). Esse é o primeiro prejuízo, que vem com a perda de emprego ou corte do salário. Mas não imaginávamos que menos da metade da população tivesse segurança alimentar no Brasil”, declarou a pesquisadora.
No período em que a pesquisa foi aplicada, no último trimestre de 2020, momento em que vários brasileiros receberam o auxílio emergencial no valor de R$ 300, ainda assim as perspectivas não se apresentaram positivas. O cenário ficou ainda pior nos três primeiros meses deste ano, após o término do benefício.
A esperança é para que haja uma leve melhoria no cenário com o retorno do auxílio emergencial que começou a ser pago na última terça-feira, 6. Também é importante mencionar que a garantia de alimentação é ainda mais afetada nas famílias com renda per capita de meio até um salário mínimo, bem como aquelas chefiadas por mulheres e negros.