A inflação, adicionada a outros fatores, como o crescimento do desemprego e da informalidade, fez a fome voltar a ser um temor ou uma realidade para milhões de brasileiros. Uma pesquisa divulgada na quarta-feira (8), realizada pela Rede Penssan (Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional) e pelo Instituto Vox Populi, revela que 33 milhões de brasileiros passam fome atualmente.
Essa quantidade é superior à de 30 anos atrás, mais precisamente 1993, quando o país tinha 32 milhões de famélicos e era lançada a campanha Ação da Cidadania contra a Fome, do sociólogo Herbert de Souza, o Betinho.
Segundo o atual diretor-executivo da Ação da Cidadania, Kiko Afonso, o país regrediu 30 anos na luta contra a fome, mas o fenômeno , apesar do alcance que tem hoje, já não causa tanta comoção na sociedade.
“O sentimento de indignação da sociedade brasileira hoje diante da fome de 33 milhões de brasileiros está muito aquém da indignação de 1993, diante da fome de 32 milhões. Estamos inertes como sociedade”, disse à Folha de S. Paulo.
O levantamento da Rede Penssan, da qual a Ação da Cidadania também faz parte, aponta, ainda, que 6 em cada 10 brasileiros convivem com algum tipo de insegurança alimentar. São 125,5 milhões de pessoas que não têm certeza se terão alimento suficiente no mês.
Por que os brasileiros estão passando fome?
O aumento da fome e da insegurança alimentar não vem de agora. A tendência se inicia em 2013, com a crise econômica e o desmonte de políticas públicas voltadas para mitigação do problema.
Exemplos desse desmonte são a redução no orçamento do Pnae (Programa Nacional de Alimentação Escolar), que financia a merenda das escolas, e a extinção do Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), no governo Bolsonaro.
A fome, no entanto, explode com o início da pandemia e o retorno da inflação alta. Em 2018, ela atingia 5,8% dos brasileiros. O percentual saltou para 9% em 2020, primeiro ano da pandemia, e para 15,5% em 2022, segundo a Rede Penssan.
A má alocação de recursos públicos durante a crise sanitária contribuiu para esse aumento, já que boa parte dos que entraram na situação de fome não conseguiram acesso, por exemplo, ao auxílio emergencial.
Nos últimos meses, apesar de uma recuperação dos efeitos da pandemia, que se reflete em leve redução do desemprego, a população brasileira continua sofrendo com a informalidade, a queda no nível dos salários e a inflação.
O aumento de preços pesa especialmente sobre os mais pobres, já que itens como alimentos, energia elétrica, gás de cozinha, aluguel e combustíveis, que ocupam a maior parte do orçamento das famílias de baixa renda, estão entre os que ficaram mais caros.