Nas última semanas, um caso de violação de direitos humanos envolvendo o Catar, sede da próxima Copa do Mundo de Futebol Masculino, esteve entre os assuntos mais comentados. A mexicana Paola Schietekat, funcionará do comitê organizador do evento, viveu um pesadelo judicial depois de denunciar um caso de agressão sofrida por um colega de trabalho.
Além de não investigar o caso, a justiça do país condenou Paola a 7 de anos de prisão e 100 chibatadas, após o agressor ter relatado que os dois mantinham um relacionamento. De acordo com as leis do país, é proibido manter relações sexuais fora do casamento. Na prática, basta que alguém faça uma denúncia, mesmo que sem provas (como foi o caso da mexicana), para que uma mulher seja condenada por esse crime.
Mas as polêmicas envolvendo a Copa do Catar vão além desse caso. Denúncias de violação dos direitos de quem trabalha na construção dos estádios e de outras obras de infraestrutura se tornaram bastante comuns desde que o emirado foi escolhido como sede. Os trabalhadores, a grande maioria imigrantes, relatam jornadas abusivas, falta de equipamentos de proteção e vários acidentes encobertos pelas autoridades locais.
Kafala
Os imigrantes, a maioria indianos, que chegam ao Catar para erguer os modernos estádios da Copa estão submetidos a condições insalubres de trabalho. Até 2016, vigorava um regime laboral para estrangeiros chamado kafala, que prevê salários menores que os pagos aos operários locais e dá ao empregador ou “patrocinador” uma série de direitos sobre o trabalhador migrante, como escolher onde ele pode se hospedar, para onde pode se deslocar, para quem pode trabalhar.
De acordo com o kafala, o patrão pode, inclusive, reter o passaporte do trabalhador e impedir que ele saia do país. Caso o empregado insista nas reclamações, o sistema permite ao empregador pedir a sua prisão.
Denúncias contra Fifa e Catar
O kafala só foi abolido oficialmente depois que a FIFA foi levada à justiça da Suíça, onde fica a sede da organização, por um trabalhador bengali chamado Nadim Alam, que resolveu denunciar as péssimas condições de trabalho para os imigrantes.
A FIFA foi absolvida, pois o tribunal considerou que a organização não estava diretamente ligada à violação dos direitos trabalhistas. Mas o caso ganhou tanta repercussão, com o envolvimento de entidades de defesa dos direitos humanos, sindicatos e até de patrocinadores, que a FIFA decidiu pressionar o governo catari por mudanças e alterar as próprias regras quanto a direitos humanos nos seus eventos.
O Catar modernizou suas leis trabalhistas, mas as polêmicas envolvendo os direitos dos operários não acabaram. Em 2019, a Anistia Internacional denunciou exploração de trabalhadores estrangeiros na organização do Mundial de Atletismo de Doha. Alguns deles estariam sem receber salários e outros impedidos de sair do país pelos seus patrões.
Outro problema que chamou a atenção de organismos internacionais foi o grande volume de acidentes de trabalho. Um relatório da Confederação Internacional Sindical apontou a morte de 1.200 operários nas construções entre 2010 e 2014 e projetou que o número aumentaria para 4.000 até 2022.
No ano passado, a Anistia Internacional voltou a denunciar o Catar, destacando que “milhares de trabalhadores migrantes morreram repentina e inesperadamente” e que “as autoridades, ao contrário das obrigações internacionais, falharam em investigar essas mortes de uma forma que tornaria possível determinar as verdadeiras causas”.