O governo do Rio de Janeiro está no centro de uma polêmica envolvendo compra de livros preparatórios para o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio), conhecidos como Kit Enem. A empresa que forneceu o material, distribuído em escolas da rede estadual de ensino neste ano, já havia vencido uma disputa semelhante meses antes, mas oferecendo R$ 7 milhões a menos pelo mesmo kit.
Em julho do ano passado, o governo do Rio aceitou comprar 53.222 kits da MKS Soluções Comerciais e Distribuidora de Materiais, por R$ 975,41 cada. A compra se daria por meio de ata de registro de preços, em que um ente público pode aproveitar as condições de um licenciamento feito por outro ente público.
Nesse caso, a MKS havia fornecido o Kit Enem pelo mesmo preço ao Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo. O valor tinha validade de um ano, tendo expirado em setembro de 2021, sem que o governo fluminense concluísse a compra.
Em dezembro, a Secretaria de Educação voltou a abrir um processo para compra de Kit Enem, mas numa quantidade maior: 197.683 coleções. A pasta novamente negociou com a MKS, mas aproveitando uma licitação do Instituto Federal do Espírito Santo, em que o kit da empresa, idêntico ao ofertado anteriormente, tinha um valor superior: R$ 1.012,48.
A estimativa é que, caso tivesse fechado a primeira compra, o governo do Rio teria economizado R$ 7 milhões ao todo.
Outra suspeita ainda pesa sobre a empresa. Conforme apurou o UOL, as duas concorrentes da MKS no último processo de compra, a Comercial Nova Trapiche e a Evolução Importação e Comércio de Vestuário e Seus Acessórios, têm telefones registrados em um mesmo escritório de contabilidade, em São Paulo.
Além disso, o dono da Evolução, Elias Mariano Paes, já se apresentou como “representante comercial” da MKS em uma licitação de um consórcio de municípios paulistas, de fevereiro de 2021.
Máscaras superfaturadas
A mesma empresa que está agora no centro da polêmica do Kit Enem já fez negócios com o governo do Rio de Janeiro antes, tendo fornecido máscaras de proteção contra o coronavírus, sem licitação e com suspeita de superfaturamento.
O Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ) apontou em relatório que a compra das máscaras, por R$ 473,2 mil, pode ter sido superfaturada em R$ 310 mil (65,5% do valor pago pelo governo).
O dono da MKS, Marcelo Konte, já foi candidato a vereador de Niterói (RJ) em duas ocasiões, em 2016, pelo PSDB, e em 2020, pelo Democratas, não tendo sido eleito em nenhuma das duas. Os dois partidos pelos quais ele concorreu são próximos do governo de Claudio Castro e são cotados para apoiá-lo à reeleição, em outubro.
Ascensão meteórica
A MKS foi fundada em 2018, com capital social de R$ 200 mil. De lá pra cá, a empresa venceu licitações com vários governos e órgãos públicos, tendo um capital social de R$ 35 milhões atualmente.
Em resposta às suspeitas de irregularidade na compra do Kit Enem, a empresa disse que o preço oferecido “era o mais vantajoso do mercado” e que houve variação no custo da matéria-prima entre um processo de compra e outro.
A Secretaria de Educação deu justificativa semelhante e acrescentou que a MKS ofereceu uma bonificação de 2.000 coleções, para reposição aos alunos. Os dados públicos sobre a compra também mostram que um critério escolhido para adquirir o kit da empresa foi a presença, nos livros preparatórios, de um QR Code que permite acessar os conteúdos por celular.