Na noite deste domingo, faltando menos de 15 dias para o segundo turno das eleições 2022, os candidatos à presidência, Lula (PT) e Bolsonaro (PL), participam do debate na BAND. Abaixo, veja o que dizem os especialistas sobre as afirmações de ambos.
Neste domingo (16), o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o atual chefe de estado, Jair Messias Bolsonaro (PL), se enfrentam em debate promovido pela Band. Entre as perguntas, falam sobre covid-19, universidades e auxílio brasil. Abaixo, um especialista político analisa ambas as candidaturas. Acompanhe:
ELEIÇÕES 2022: quem tem mais chances de ganhar, Lula ou Bolsonaro? Especialista responde
Cientes da importância de promover um jornalismo democrático, o FDR convidou o cientista político Caio Rabelo para uma entrevista exclusiva. Mestre pela Universidade de São Paulo (USP), ele explica as principais diferenças entre os planos de governo de Lula e Bolsonaro, seus maiores erros, acertos e quem tem chances de desempenhar uma melhor gestão. Confira:
Qual a principal diferença no plano de governo de Lula e Bolsonaro?
A narrativa do plano de Bolsonaro tenta equacionar um paradoxo: o candidato que fez carreira criticando os benefícios sociais precisou ampliá-los para se colocar competitivo nas eleições deste ano.
Então o plano de governo do presidente explora a ideia de que é necessário “dar o peixe enquanto se ensina a pescar”, pautando temas como apoio ao empreendedorismo, simplificação tributária, etc.
Já o plano de Lula se coloca como um rol de diretrizes, dada a amplitude da coalizão que o petista vem montando para enfrentar o presidente – recentemente, por exemplo, precisou incorporar as sugestões de Marina Silva na parte ambiental.
Nesse sentido, o que podemos intuir das diretrizes apresentadas pelo petista é a necessidade de retomar a institucionalidade para promover crescimento econômico (principalmente na economia verde) reduzindo as desigualdades no mundo do trabalho, buscando a formalização e aumento de salários acima da inflação.
Quem tem uma melhor desenvoltura política para garantir a recuperação econômica do país?
Lula. Há um claro interesse do ex-presidente em conseguir costurar da maneira mais rápida possível um acordo de livre comércio com a União Europeia, que hoje esbarra nas preocupações da UE com os compromissos climáticos do Brasil.
Isto poderia ser instrumental para o atingimento das metas traçadas por Lula nas diretrizes do plano de governo – o Brasil aproveitaria o dólar alto e a derrubada de barreiras alfandegárias para buscar um crescimento econômico verde incorporando tecnologias europeias.
ELEIÇÕES 2022: saiba o que os candidatos prometem para os segurados do AUXÍLIO BRASIL
Auxílio Brasil ou o retorno do Bolsa Família? Que projeto é mais eficaz para a população de baixa renda?
É possível reimaginar a pergunta, porque o Auxilio Brasil só existe por conta da criação dos mecanismos de governança do Programa Bolsa Família. O CadÚnico e a rede de CRAS e CREAS capilarizada por todos os municípios brasileiros se desenvolveram em função do Bolsa Família.
O Auxílio Brasil vem como uma tentativa de capturar a imaginação do eleitor sobre os valores pagos pelo Auxílio Emergencial da pandemia. Ao mesmo tempo, a gestão Bolsonaro precarizou os mecanismos de governança e de gestão por condicionalidades (vacinação, acompanhamento de gestante, matrícula escolar) que existiam para o Bolsa Família, restando apenas o aumento do valor conquistado pela oposição de esquerda no Congresso durante a pandemia.
É muito positivo o reajuste dos valores pagos – na pandemia tivemos a real dimensão da desigualdade brasileira e de como um programa de renda mínima pode solucioná-la, mas fazê-lo sem a rede de promoção da cidadania criada pelo Bolsa Família traz problemas como a captura do programa e da renda dos beneficiários para empréstimos consignados, por exemplo.
Reforma tributária: quais mudanças devem ser implementadas em ambas as gestões e quais os impactos para o povo?
É preciso deixar o gráfico de pizza da tributação brasileira (divisão entre consumo, renda e patrimônio) mais parecido com o da média da OCDE se quisermos pensar em ter uma sociedade mais equitativa.
É preciso reduzir os impostos sobre o consumo e aumentar a progressividade dos impostos de renda e patrimônio, considerando sempre que estes geram externalidades positivas (ganhos difusos para a sociedade).
Por exemplo, aumentar o Imposto Territorial Rural diminui a concentração fundiária e a degradação ambiental. Aumentar o ITCMD (imposto sobre heranças) é uma questão de justiça intergeracional em uma sociedade alicerçada na escravidão como a nossa.
Privatização: o que esperar do futuro das estatais nacionais? Em qual governo elas estão ameaçadas?
O governo Bolsonaro tem uma clara preferência ideológica pelas privatizações e isto coloca algumas questões importantes a respeito do papel que o Estado deve ter em cumprir “missões” sociais e ambientais.
Notadamente na área de energia, com a privatização da Eletrobras e possível privatização da Petrobras, considero temerário que o estado não busque desenvolver uma política de ciência e tecnologia e adaptação às mudanças climáticas através do investimento público.
Petrobras e combustíveis: o que esperar dos reajustes tarifários de 2023?
Caso Bolsonaro permaneça, o Brasil pode esperar um estelionato eleitoral – nada foi feito de concreto para mudar a PPI e os preços caíram em função da desorganização das contas dos estados com a redução do ICMS, de algumas iniciativas pontuais da gestão e de flutuações no cenário internacional. O represamento é artificial e gera passivos complicados para o próximo governo.
Educação: existe um planejamento para minimizar os impactos da pandemia? O que dizem os candidatos?
Lula tem falado em realizar mutirões como forma de recuperar a “geração COVID” que sofre com a distorção idade-série e com a baixa capacidade do atual governo de disseminar políticas que não dizem respeito ao umbigo de uma classe média completamente ignorante do que é a realidade educacional do Brasil.
Nesses últimos anos falou-se muito em homeschooling, escola sem partido, ideologia de gênero, e pouco em SAEB, em como replicar experiências exitosas de municípios para todo o país, em como diminuir a evasão escolar e tantas outras coisas que deveriam ser a ordem do dia, mas não são.
Corrupção: quais os planos de fiscalização dos candidatos para evitar escândalos e corrupção? Quem tem o melhor histórico de transparência à frente da presidência?
Gosto de pensar na questão da corrupção sob uma ótica institucional: o Brasil levou anos para retirar a corrupção do processo orçamentário a partir do escândalo dos Anões do Orçamento.
Foi um processo custoso de interação entre as instituições e os incentivos eleitorais dos parlamentares que nos levou a um novo normal de transparência e políticas públicas com benefícios difusos: a Estratégia de Saúde da Família, o Luz para Todos, o Bolsa Família, o PNAE, para citar alguns poucos. O governo Bolsonaro conseguiu destruir a institucionalidade que garantia que o orçamento fosse destinado a políticas públicas de Estado, com “E” maiúsculo.
O orçamento secreto é uma corrupção dupla: garante que só alguns brasileiros tenham acesso às políticas públicas (que dependem da boa vontade do político local) e que a transparência sob o processo de licitação dos serviços e obras executadas seja irrisória.
É inimaginável que tenhamos todo ano a execução de orçamentos para escolas que não têm saneamento básico, mas recebem kits robótica; para cidades que “realizam” milhares de procedimentos odontológicos mas não têm perfil populacional para isso; para tratores sem uma política adequada de assistência técnica e extensão rural.
Falar de orçamento secreto é falar da erosão democrática (foi iniciativa do general Luiz Eduardo Ramos) patrocinando a irracionalidade na alocação de recursos públicos da monta de 19 bilhões por ano, retirando recursos da cultura, ciência e tecnologia e até do tratamento do câncer.
Não há comparação possível com qualquer outro governo na história da Nova República. Todos foram mais transparentes e probos porque lidavam com uma rede de prestação de contas que o governo Bolsonaro ou cooptou ou intimidou.
Histórico político: quais os maiores erros e acertos cometidos pelos candidatos e como isso deve influenciar o voto do eleitor?
No cenário atual, convém falar sobre a volta da fome. A definição de agenda de políticas públicas ocorre pela apresentação de problemas às sociedades humanas, e nenhum problema se coloca tão despudoradamente quanto a desnutrição.
Nesse sentido, o maior acerto de Lula foi ter buscado consistentemente ao longo dos seus dois mandatos a superação da fome como o objetivo maior da sua vida. E o maior erro de Bolsonaro foi ter assinado, no primeiro dia do seu mandato, a extinção do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional.